DA TABERNA, AS FLORES E OS SEUS ESPINHOS
Chegou à Taberna da Rua das Flores e o Tiago já estava à porta, conjuntamente com outros grupos e outros casais ocupando grande parte do passeio estreito. Todos aguardavam mesa, alguns com um copo de vinho conversando animadamente, outros olhando para o relógio.
Chegou à Taberna da Rua das Flores e o Tiago já estava à porta, conjuntamente com outros grupos e outros casais ocupando grande parte do passeio estreito. Todos aguardavam mesa, alguns com um copo de vinho conversando animadamente, outros olhando para o relógio.
- Já temos o nome na lista. Agora é aguardar por mesa!
- Ainda bem que conseguiste chegar mais cedo. Como foi hoje na clínica?
- Finalmente um dia mais calmo, aproveitei para tratar da papelada.
Tiago deu-lhe um beijo rápido. Uma formalidade. Não soube a nada. Vagamente
a papel.
Mariana espreitou para dentro da taberna. Um espaço pequeno para tanto
sucesso, com cadeiras e bancos em madeira, mesas com tampo de mármore e um chão
de mosaico. Nas paredes armários de vidro com vinhos, conservas e cervejas
artesanais completam a decoração simples, como se quer numa verdadeira taberna.
Sem excessos.
Situado na rua com o mesmo nome, em pleno Chiado, há muito que faz parte de
quase todos os roteiros e guias nacionais e estrangeiros. Com uma ementa pequena
e que pode variar todos os dias, é fiel aos produtos da estação e tem como missão recuperar alguns sabores
que já tínhamos esquecido e incorporar novos. Não aceita reservas por telefone,
faz parte da filosofia da casa chegar, dar o nome, receber um cálculo
aproximado da hora para regresso e esperar. E esperar. Sabendo as regras,
Mariana gostava muito de lá ir. Por ela, valia sempre a espera!
Um rosto familiar numa das mesas chamou-lhe a atenção. Virou-se para o
Tiago e justificou-se:
- Vou só lá dentro cumprimentar um amigo que já não vejo há imenso tempo.
Dá-me um minuto.
Alguém disse o seu nome com um sorriso rasgado, abrindo os braços calorosos
quando a viu aproximar-se. Ela não queria interromper. Era só para dizer um
olá.
- Luís! Por Lisboa? Como estás? Não sabia que já tinhas regressado. Como
foi lá no Dubai?
- Eu já voltei há mais de um ano e estive no Qatar Mariana. Nunca mais te
vi. De vez em quando estou com o teu irmão. Temos de combinar alguma coisa. O
Tiago? Tudo bem convosco?
-Está bem, está ali fora. Aguardamos a nossa mesa. Sim, vamos falando,
claro. Bom resto de jantar!
Luís deu-lhe um beijo no rosto em jeito de despedida. Morno e meigo. Soube
a Verão.
Quando se virou ele agarrou-a pelo braço. Sentiu a sua mão firme por cima
do casaco.
- Está tudo bem?! – Disparou olhando-a nos olhos.
Porquê aquela pergunta? Ajeitou o cabelo, talvez estivesse desalinhado
(como quase sempre) e passou a mão pelo rosto. Acenou com força e seguiu. A
mesa junto à porta já estava pronta e Tiago acenava impaciente.
Um grande quadro de ardósia com a ementa do dia escrita a giz é colocado
bem à frente dos seus olhos e uma jovem entusiasta explicou com detalhe em que
consistia cada prato. O difícil foi escolher! Optaram por se focar nas opções
do mar e começar com um clássico da casa, o picadinho de carapau (7,50€). Peixe
fresquíssimo marinado com gengibre, maçã verde, aipo, cebola roxa e limão. O
preferido do Tiago.
De seguida viria um tataki de atum ligeiramente braseado, delicioso, com
sementes de sésamo e um molho espesso com miso (14€). Para fechar pediram espetadas
de vieira enroladas em bacon estaladiço com maionese de wasabi (14€) que nunca
dececionam. Antes ainda veio o couvert (3,50€) com broa muito boa, pão saloio, azeitonas
marinadas e uma tacinha com azeite.
Hoje Mariana revê os momentos vividos a dois vezes sem conta. Este jantar e
muitos outros antes e depois deste. A rotina já se tinha instalado, reconhecia,
mas o amor estava lá, certo? Onde se tinham perdido enquanto casal?
"7 anos para o lixo. 7 anos para o lixo." Não conseguia parar de repetir
baixinho.
Queria tanto voltar atrás no tempo, analisar as palavras, as que foram
ditas, mas sobretudo as que ficaram entaladas por dizer. E saber o que fez mal.
Foi tudo culpa sua.
Tiago vagueava agora o olhar pelo telemóvel, o garfo na mão direita, distraído,
picava devagar o bolo de chocolate delicioso
e de sabor intenso polvilhado com açúcar (3€). Mariana não quis sobremesa. No
ecrã sucediam-se fotos, frases inspiradoras e as notícias de última hora do
outro lado do mundo, que agora é o nosso quintal.
Ela procurou o dela à solta na mala e fez o mesmo.
Um empregado interrompeu o momento e fez menção de que outro casal esperava a mesa. Ainda
havia muitas refeições por servir naquela noite. Pagaram e seguiram para o
parque de estacionamento. O dia seguinte era de trabalho.
Mariana
Reis
Taberna da Rua das
Flores
Portuguesa/Petiscos
Rua
das Flores, 103 (Chiado) Lisboa
15€/pax.
aproximadamente
Descanso
semanal: Domingo
De
segunda a sexta: 12:00 às 00:00
Sábados:
16:00 às 00:00
Não
aceita reservas
Não
aceita cartões
"Qualquer um pode
amar uma rosa, mas é preciso um grande coração para incluir os espinhos."
Clarice Lispector
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